The Night After (Instead of the Morning Before)

Vamos Ter a Noite Seguinte, Em Vez da Manhã Anterior é um projeto de curta-metragem de produção universitária que conta a história de uma jovem e desiludida revolucionária chamada Cleo e de sua relação incerta com Jorge, amigo de infância e possível paixão reprimida da protagonista. Tratando sobre como os espaços físicos transformam o interior humano, na mesma medida em que os sentimentos mais íntimos são capazes de metamorfosear por completo seus ambientes circundantes, a história e a proposta artística deste curta-metragem surgiu como um projeto a ser desenvolvido especialmente a partir de dois contextos pessoais.
De início, por uma vontade há muito presente de realizar uma produção autoral que carregasse fortes convenções de linguagem do noir e do romance clássicos. Esse intuito criativo, entretanto, nunca me pareceu atrativo pelo ponto de vista de uma realização que buscasse mimetizar produções estrangeiras: sendo um filme realizado no Brasil, deveria se pautar por não ser apenas um noir de romance, mas de ser idealizado e gerado no mundo como um noir de romance verdadeiramente brasileiro. A ideia de “abrasileiramento” de gêneros clássicos de origem estrangeira sempre me pareceu intensamente frutífera do ponto de vista criativo, e era natural que surgissem as circunstâncias necessárias para transformar esse gosto, enfim, em um projeto.
Aqui entra o segundo contexto: estar em meio a essa possiblidade de desenvolver um projeto que fosse verdadeiramente autoral me levou a resgatar uma antiga criação literária minha. Em sua origem, Vamos Ter a Noite Seguinte é um conto, que acabou por ser um objeto muito favorável para as projeções criativas que eu e, por sua vez, toda a equipe trazíamos no campo do audiovisual, não demorando a adaptá-lo para um roteiro de curta-metragem.
E é em seu próprio contexto de produção universitária que acredito que ele mais se propulsione criativa e potencialmente. Tratando-se de um filme que se pauta pela explicitude da artificialidade, a intenção desde o início esteve em impulsionar por meio dele pensamentos e práticas que fossem para além daquelas majoritariamente promovidas a nível universitário e brasileiro. A confecção e o uso de maquetes, as cenografias teatralizadas construídas em estúdio, o som moldado pela estilização e pela livre criação... A ideia de autoralidade em Vamos Ter a Noite Seguinte atua na mesma medida em que suscita o pensar e o trabalhar em conjunto, que traz para o primeiro plano a atuação do departamento de arte por muitas vezes relegado a invisibilidades teóricas e técnicas, e que, enfim, desafia-se a projetar novas visões artísticas e caminhos de realização que partam desse tão prolífico meio universitário de criação artística brasileira em direção a qualquer destino que se proponha (e sonhe) alcançar.

Rafael Rocha