Nacional Um

Com este trabalho pretendi cartografar a Estrada Nacional Um, que une as duas principais cidades portuguesas, Lisboa e Porto. Criada no Plano Rodoviário Nacional de 1945, foi durante várias décadas a mais importante artéria rodoviária nacional. Tão caótico quanto imprescindível, o património material e humano da EN1 reflecte ainda modelos de desenvolvimento conflituantes e difusos, certamente decorrentes do Portugal caracterizado pelo desejo de modernidade sistematicamente inibido pelo Estado Novo. Ainda assim constitui, actualmente, um local de passagem tão crucial como intrigante, na medida em que alberga uma memória muito específica e peculiar de um país desorganizado e hesitante entre o urbano e o rural, o sofisticado e o tradicional.
À tendência dominante de um paradigma marcado pela valorização da velocidade e imediatismo, quer nas vias de comunicação físicas, quer virtuais, a Nacional Um vai, contudo, resistindo à perda de protagonismo, como sucedeu com uma significativa recuperação de vivacidade aquando da implementação das medidas de ajustamento estrutural durante o período de intervenção daquilo que ficou designado como Troika.
Ao percorrer sistematicamente a EN1, e quando cai a noite, começam a revelar-se, e impor-se, estruturas comerciais vernaculares, despojos industriais, entretenimentos adultos, estruturas e indivíduos improváveis. Sempre à noite, e para lá da beira da estrada, um sentimento entre o abandono e uma vida ulterior subsiste, circulando distintos vultos e luzes.